Ganhei esse livro de presente de aniversário dos meus colegas de república, em Belo Horizonte. O título é bastante apropriado para minha vida de mestrando de quarto semestre de economia, vivendo em função da dissertação (ou não) em casa. Foi uma leitura agradável.
O livro "A Economia do Ócio", organizado por Domenico de Mesi, consiste em uma coletânea de duas obras: Elogio ao Ócio, de Bertrand Russell, e Direito ao Ócio, de Paul Lafargue. Ambas as obras são escritas por autores de viés esquerdista, apesar de Russell adotar um paradigma teórico baeado no utilitarismo britânico em seu texto, enquanto que Lafargue utiliza uma tradicional retórica marxista. Os autores criticam o "culto ao trabalho" instalado na cultura ocidental moderna, isto é, a visão do trabalho como uma virtude intrínseca, um bem, um fim em si mesmo. Para ambos os autores, tal perspectiva de pensamento é errônea, alienante, e historicamente muito recente, datada do desenvolvimento do capitalismo industrial (metade do século XVIII). O trabalho deve ser visto como um meio de se produzir os bens e serviços necessários para se obter um determinado patamar, equilibradamente distribuído na sociedade, de conforto material. Os verdadeiros fins da produção econômica são o consumo e o lazer, e não o trabalho e a produção.
Paul Lafargue utiliza a linguagem marxista mais emocional possível para defender que o culto ao trabalho fora instalado pela moral burguesa que dominou progressivamente as sociedades ocidentais com a expansão da industrialização, em detrimento da moral cristã tradicional. Segundo o autor, a moral do trabalho é um instrumento político de dominação e alienação dos trabalhadores, pressionados para se transformar em meros meios de produção ambulantes. Lafarge chega ao ponto de afirmar que a moral burguesa do trabalho é mais injusta do que a moral cristã feudal, ou mesmo que a moral clássica escravista, já que essas ao menos reconheciam algum tipo de virtude na vida intelectual, política e contemplativa. Todavia, a moral do trabalho estaria minada pela tendência de superprodução de bens pela economia (outro ponto crucial da teoria marxista), ito é, produção em nível acima do que a sociedade é capaz de produzir, o que leva a crises periódicas de recessão e de falência de empresas. Por essa linha de pensamento, achei o texto de Lafargue um tanto previsível e monótono.
Bertrand Russell me chamou muito mais a atenção. O autor, filósofo britânico, reconhece a individualidade dos processos sociais, isto é, a interação entre as ideologias e as culturas coletivas com o processo pessoal de tomada de escolhas e decisões. Para o autor, o culto ao trabalho não é uma imposição estrutural de luta de classes, mas um resíduo do passado, isto é, da preocupação do indivíduo com a sua subsistência. Mas, em uma sociedade industrial, em que o trabalho humano tem sua produtividade potencializada pelo progresso tecnológico, tal cultura se torna anacrônica, trazendo para as pessoas nada mais do que alienação, ansiedade e preocupações desnecessárias. A solução para esse problema está no desenvolvimento de métodos científicos para a administração pública e privada da alocação de recursos, o que inclui desde reformas educacionais (a educação para o lazer, que já referi em um post anterior), reformas arquitetônicas para minimizar o trabalho doméstico, estruturação dos sistemas financeiros nacionais de forma a reduzir o impacto e a incidência dos ciclos econômicos, e até mesmo a construção de um novo modelo político. Russell era um socialista, mas discordava dos seus contemporâneos marxistas por não acreditar que o motor da dinâmica social é a luta de classes. Para o autor, o desenvolvimento científico administrativo poderia criar um modo de produção planejado e centralizado mais eficiente do que o formado pela busca individual pelo lucro.
Em resumo, ambos os autores são muito polêmicos. No caso de Russell, a polêmica está combinada com uma dose de excentricidade. O livro é uma típica leitura de filosofia, muito interessante para expandir os horizontes de pensamento e de possibilidades de conhecimento, mas sem necessariamente concordar com os autores.
terça-feira, janeiro 06, 2009
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Um comentário:
Bela descrição da obra.Parabens pela mente aberta que tem.Paulo rs.
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