A partir desse post, vou publicar alguns gráficos que montei a partir de dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD) referente ao ano de 2007 para ilustrar alguns aspectos da distribuição de renda no Brasil.
Em primeiro lugar, meus gráficos são montados pela distribuição de indicadores sócio-econômicos por decis de nível de renda per capita domiciliar. Os decis são montados de uma maneira muito simples: eu listei todos os indivíduos do banco de dados com base na renda mensal per capita de seu domicílio (variável construída já presente no banco de dados original), do mais pobre ao mais rico, e dividi a população assim listada em dez grupos com um mesmo número de pessoas, isto é, em quantis. Esses grupos são os decis populacionais, e são organizados da seguinte maneira: o primeiro decil engloba os 10% mais pobres da população, o segundo engloba dos 11% aos 20% mais pobres, e essa logica segue até o décimo decil, que integra os 10% mais ricos.
Após a construção dos decis populacionais, pode-se comparar as características sociais, econômicas e demográficas das diferentes faixas de renda. Assim, importantes perguntas podem ser respondidas a respeito da distribuição de renda no Brasil.
Em primeiro lugar, a distribuição da renda de acordo com duas medidas, a renda domiciliar per capita (variável utilizada para construir os decis), e a renda individual do trabalho. O resultado é o seguinte:
Pelo gráfico, é possível visualizar o "desfile de anões" na sociedade brasileira. Esse conceito foi cunhado por um autor importante da Economia do Bem-Estar Social em um paper que li no mestrado (acho que era o Angus Deaton). Em resumo, o autor imaginou uma população cuja altura das pessoas fosse proporcional a sua renda, em comparação com a média da sociedade. Além disso, esse país imaginário possui um desfile de carnaval anual em que todas as pessoas desfilam, e os blocos são organizados por ordem de altura das pessoas (primeiro os baixinhos, depois os gigantes). Segundo o autor, se a distribuição de renda desse país fosse semelhante aos dos países reais, tal carnaval seria um verdadeiro desfile de anões, em que a grande maioria da população seria de altura bastante inferior à média, ao passo que os últimos indivíduos a desfilar seriam titãs colossais de vários quilômetros de altura.
Isso é exatamente o que vemos no gráfico. A distribuição de renda é praticamente linear até o oitavo decil, a partir do qual cresce exponencialmente. Além disso, a renda domiciliar per capita do décimo decil é quase o dobro em relação a do nono.
Também é possível ver que a renda domiciliar per capita e a renda individual do trabalho são coincidentes até o oitavo decil, o que demonstra que o fator trabalho é praticamente a única fonte de renda para cerca de 80% da população brasileira. Não sei se a base de dados inclui o recebimento dos programas públicos de transferências de renda, como o Bolsa Família. Se incluir, está indicando que esses programas ainda são muito tímidos para elevar o bem-estar das famílias mais pobres.
Por fim, o gráfico permite ver qual é o perfil de renda da classe alta brasileira, isto é o décimo decil. A renda desse grupo é de cerca de 1500 reais per capita. Imaginando-se uma família de quatro pessoas, dois adultos e duas crianças, isso equivale a uma renda familiar total de 6000 reais por mês. Ou seja, a "elite" brasileira é predominantemente composta por famílias em que o pai ganha R$ 3500 por mês, e a mãe, R$ 2500, e sustentam dois filhos. Isso é muito diferente das "elites" descritas pelos discursos dos políticos do governo federal, ou do que o senso comum pensa. Não são mega-empresários, não são juízes do Supremo Tribunal Federal, não são políticos do alto escalão do governo, não são os chefes do tráfico do Rio de Janeiro e não são os coronéis nordestinos de chapéu branco, representados das novelas da Globo.