Semana passada, na disciplina de Macroeconomia II daqui do programa de pós-graduação em Economia do CEDEPLAR-UFMG, estudamos a Nova Geografia Econômica, área que rendeu o prêmio Nobel de Economia para o Paul Krugman no ano passado. Em resumo, a Nova Geografia Econômica utiliza modelos de equilíbrio geral para explicar o crescimento econômico em economias abertas, ressaltando a importância dos custos de transporte, os diferenciais salariais e do movimento de fatores de produção para explicar a dinâmica internacional do crescimento econômico. O principal artigo dessa área que li foi escrito pelo próprio Krugman, junto com o Anthony Venables, da Universidade de Oxford.
O artigo “Globalisation and the Inequality of Nations”, de Krugman & Venables (1995) tem o objetivo básico de compreender os efeitos da globalização sobre a renda real das economias nacionais. Os autores partem de um modelo de acordo com o qual, em um ponto de tempo inicial, não há diferenças entre os países, até que uma divisão internacional do trabalho apareça espontaneamente, beneficiando mais algumas economias do que outras. Assim, a economia mundial se divide em um arranjo de centro, englobando as economias de maior renda, e periferia, englobando as economias menos desenvolvidas. Em resumo, o trabalho de Krugman & Venables procura explicar, de acordo com um modelo teórico, como a globalização, entendida pela crescente integração entre os mercados internacionais, afeta a renda real dos países que compõem o centro e a periferia.
Os autores partem da hipótese de que a globalização é compreendida como um processo de redução progressiva do custo de transporte de mercadorias entre os países. Esse processo afeta a dinâmica da economia mundial em dois estágios. Primeiro, aumenta a desigualdade entre as nações, com ganhos de renda pelo centro em detrimento da periferia. Segundo, há uma convergência entre as economias, com o crescimento da renda da periferia e o estancamento do crescimento da renda do centro.
O modelo teórico parte de um mundo com duas regiões, Norte e Sul. Essas regiões apresentam estruturas econômicas homogêneas, isto é, não há vantagens comparativas inerentes a elas relacionadas a produção de alguma determinada mercadoria. Existem dois bens, produzidos respectivamente pelo setor agrícola, que opera sob retornos constantes de escala, e pelo setor manufatureiro, que opera sob retornos crescentes de escala e produz tanto bens finais de consumo, como insumos intermediários de produção. Em ambas as regiões, os agentes consumidores apresentam funções de utilidade refletindo preferências do tipo Cobb-Douglas (isto é, de amor pela variedade, ou preferências bem-comportadas) entre esses dois bens.
Supondo que inicialmente os custos de transporte de mercadorias entre o Norte e o Sul são muito elevados, não haverá comércio entre as regiões. Elas serão auto-suficientes no que diz respeito à produção tanto de bens agrícolas, como de manufaturas. Se os custos de transporte caírem, inicialmente aparecerá um comércio interregional de bens manufaturados diferenciados, mas sem tendência à especialização produtiva por qualquer região. Se esses custos caírem ainda mais, haverá um incentivo à especialização regional. Pois, a região com maior setor manufatureiro conseqüentemente tem um maior mercado para a produção de insumos intermediários, o que atrai empresas manufatureiras estrangeiras para a sua produção. Da mesma forma, a região com maior produção de bens intermediários pode produzir bens de consumo a menores custos, pela economia dos custos de transporte, o que também atrai empresas manufatureiras para a sua produção. Em suma, há uma aglomeração da atividade industrial na região em que ela era relativamente mais abundante, fazendo com que a economia mundial se divida entre um centro industrializado e uma periferia predominantemente agrícola. Assim, o padrão mundial de desenvolvimento econômico é desigual: enquanto que no centro os custos de transporte de bens de consumo industrializados é menor e a demanda por mão-de-obra é maior devido a atração de firmas, há uma tendência de progressiva elevação dos salários reais, na periferia a demanda por mão-de-obra é decrescente devido ao processo de desindustrialização, o que pressiona os salários reais para baixo.
Contudo, se os custos de transporte caírem ainda mais, as vantagens localizacionais das economias definidas como centro, isto é, de proximidade dos mercados consumidores e de insumos, podem se esgotar, e a periferia pode começar a atrair investimentos no setor industrial por causa dos baixos salários. Dessa maneira, cria-se um movimento internacional de convergência de renda e de saláios entre o centro e a periferia.
Os autores concluem o seu estudo procurando utilizar os fundamentos de seu modelo para prever o impacto de políticas comerciais protecionistas. Supondo que o Norte imponha uma tarifa protecionista sobre as importações, os seu impacto final sobre o bem-estar mundial, segundo Krugman & Venables, é sempre negativo, e, sob o ponto de vista regional, é sempre ambíguo. Por um lado, como prejudica o acesso do Sul ao seu mercado, acaba por incentivar a atração das empresas sulistas no seu território. Mas, por outro lado, as empresas do Norte acabam por ter que pagar mais pelos insumos importados do Sul, ou seja, sofrem com custos de transporte maiores.
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