Na semana passada, estive em São Luís, capital do Maranhão (feudo de Sir Ney, o Terrível) para o encontro nacional da Sociedade de Economia Política. Passei, junto com ex-colegas de pós-graduação da UFMG, quatro dias sob clima amazônico: calor abafado de 40 graus todos os dias, sob sol muito forte. Esse clima era brevemente, mas diariamente, interrompido por violentas tempestades tropicais de meia hora, que, todavia, não ajudavam a refrescar o ambiente. E o pior foi que a faculdade de ciências sociais aplicadas da UFMA, sede do evento, é toda construída em concreto, de modo que as mesas de apresentações de trabalhos se tornaram verdadeiras chocadeiras. Pelo menos, as seções principais foram apresentadas em um auditório improvisado, dotado de potentes ar-condicionados.
Eu apresentei o meu clássico artigo - veterano de quatro congressos - sobre a metodologia da economia sob os conceitos de Imre Lakatos. Minha seção foi muito boa, como foram apenas duas apresentações, tive meia hora para expôr o trabalho, e mais uma hora para debater com os ouvintes. A outra apresentação da sessão foi da Angela Ganem (UFRJ), que fez um excelente paralelo entre a metodologia da ciência em Popper e na Escola de Frankfurt. O debate com o público (umas dez pessoas), comandado pela professora Leda Paulani (UFRJ) e pelo simpático professor uruguaio Ramon Garcia Fernandez (FGV-SP) foi frutífero e desafiador. Recebi críticas e comentários muito pertinentes que certamente vão me ajudar para a futura publicação do artigo em periódico.
Além desses comentários, recebi outros bastante - digamos - criativos. Quando expliquei que, segundo Lakatos, todo programa de pesquisa científico é fundamentado por um núcleo de hipóteses metafísicas, uma aluna da UFRJ me perguntou qual era o conceito de metafísica que o autor utilizava. Respondi que simplesmente ele se referia a hipóteses que não podiam ser testadas empiricamente, e que eram simplesmente aceitas pelos cientistas integrantes de um determinado programa. A moça, então, comentou que eu deveria explorar melhor a relação entre o conhecimento científico e a metafísica a partir da filosofia budista e dos Vedas do hinduísmo. Em seguida, outro aluno de mestrado (não sei de que instituição), dissertou durante uns dez minutos sobre a metafísica de Hegel, com passagens em alemão!
No mais, não gostei muito das outras seções do congresso que assisti. A maior parte dos apresentadores parece dominar o pensamento de seus autores favoritos, mas, na hora de aplicar esse conhecimento à conjuntura e aos problemas da economia real, faltam métodos analíticos e sobram distorções teórico-empíricas, retórica de esquerda e adjetivos de impacto (tipo, o sistema financeiro mundial é "perverso"; a economia norte-americana está "fodida", etc.). Esse problema é o que considero o mais grave na heterodoxia econômica em geral, isto é, a insistência em tentar entender questões contemporâneas baseadas em referências a autores clássicos em seus originais.
Outro ponto que achei controverso foi em relação ao debate sobre política econômica brasileira. O representante do governo expôs as diretrizes institucionais da política fiscal no Brasil e gráficos sobre os principais indicadores de análise. Porém, ao contrário do que eu esperava, não houve um confronto ideológico após a sua apresentação. Mesmo os marxistas mais radicais, que consideram fatores como o câmbio flutuante e o superávit primário como insultos pessoais, ficaram calados, ou quando muito fazendo sugestões pontuais, no geral apoiando o governo.
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