O Retrato de Dorian Gray é a obra-prima do irlandês Oscar Wilde, e sua trama, isto é, o seu enredo, é bastante complexo, exigindo minuciosa interpretação.
O livro conta a história de um rapaz (Dorian Gray), modelo de pintura, que, influenciado por um amigo (Lord Henry), toma consciência de sua aparência física singular, assim como da limitação de sua aparência ao longo do tempo, pensa em realizar um pacto com o diabo, de modo que o seu retrato envelheça no lugar dele próprio, ao longo dos anos. E, inexplicavelmente, isso acontece. Além disso, Lord Henry apresenta a Dorian Gray o hedonismo, isto é, ter como objetivo de vida simplesmente a satisfação de suas necessidades e a busca de novos prazeres, ignorando toda e qualquer forma de moral, vista pelos personagens como uma indesejável influência da sociedade sobre os indivíduos. Por isso, décadas se passam, Dorian Gray se entrega a uma vida voltada para festas, drogas e crimes, sendo que apenas o seu retrato sofreria as conseqüências físicas de suas ações.
O livro é cheio de pequenos trechos cujos personagens e suas ações muitas vezes não parecem fazer sentido lógico, o que torna o livro de difícil compreensão. Mas, tendo algum conhecimento sobre a vida e a obra de Oscar Wilde, assim como de suas influências, algumas conclusões podem ser tomadas.
Oscar Wilde, em seu segundo prefácio, mostra-se simpático aos ideais parnasianos, criticando o irrealismo da arte Romântica (o despeito de Calibã por não ver seu rosto no espelho) e a vulgaridade da literatura Realista. Segundo o autor, a arte não deve ter nenhuma influência de qualquer expressão ética ou moral, mas sim expressar a busca, por cada artista, de seu conceito de beleza plena. Ou seja, a arte seria um objetivo em si mesma (arte pela arte), determinada apenas pela intenção do artista em expressar o seu conceito de beleza formal. Em um trecho da obra, Wilde explica que um livro nunca pode ser rotulado de "imoral"; a imoralidade está na sociedade em que o artista vive, e que influenciuou (negativamente, para o autor) o livro. Portanto, para interpretar o "Retrato de Dorian Gray", deve-se evitar procurar críticas sociais, e deter-se mais nas questões individuais e formais artísticas.
No prefácio, o autor deixa claro que o primeiro capítulo de sua história é baseada em um fato real, sendo que Wilde corresponde ao Lord Henry. Por isso, a filosofia hedonista como ideal de vida ao homem corresponde exatamente ao seu ponto de vista. Ou seja, não parece sensato associar o Lord Henry ao diabo, que tenta os homens, como vários críticos apontam.
A meu ver, o livro conta na verdade a própria contradição entre arte e moral, exposta por Wilde no seu prefácio. Assim, Dorian Gray representa a arte como ela deve ser, formalmente e esteticamente plena, sendo que Lord Henry, ao defender perante Dorian o hedonismo como um ideal, defende a desvinculação entre a expressão artística e a moral social. Já o retrato representa a consciência da arte, isto é, a visão que a sociedade tem dessa expressão artística, que sempre acaba distorcida e deformada pelos vícios da própria sociadade, e repassados à obra. Tal consciência acaba por gerar os conflitos entre o artista e sua obra, o que no livro significou o assassinato do pintor do retrato (o artista) por Dorian Grey (sua obra), devido a sua revolta pela deformação de seu retrato (a consciência da arte).
Por fim, Dorian Grey não envelhece nunca, mesmo não tendo realizado nenhum esforço para manter sua juventude (nem mesmo pactos com o diabo, como a crítica tradicional sugere). O que pode simbolizar isso? Muito provavelmente, o autor quis transmitir a idéia de que a beleza, como um ideal artístico, é fixa e imutável ao longo do tempo, isto é, de que os artistas, em qualquer época e qualquer lugar, buscam sempre expressar esse ideal de beleza, mesmo que suas obras e seus modelos variem.
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Há uma hora
3 comentários:
Hm, já ouvi falar muito bem do livro. Quero ler!!!
Adicionei o link do teu blog no meu flog...
o e-book:
http://www.4shared.com/file/25401705/17ef6dd6/Oscar_Wilde_-_O_Retrato_de_Dorian_Gray_pdf
Eu, em uma discução em que o assunto 'Dorian Gray' surgiu como uma comparação de semelhança com o personagem do romance de Thomas Mann, Félix Krull, redigi uma breve interpretação que gostaria de compartilhar, pois, apesar de não ir diretamente ao encontro da sua, tem algumas diferenças essenciais.
Básicamente, o retrato escondido das vistas do mundo, sobre o qual recaem todas as consequências dos vicios do protagonista, seria apenas uma proposição hipotética. Mostra que qualquer homem que não sofra as consequências de seus atos tende a degenerar-se.
Não anula a sua interpretação, pois enquadra um outro ângulo da situação, mas difere, e portanto me daria gosto que tu me desses um feedback. Tive, como disse, uma discução a esse respeito, em que sitei a grande discução que se elevava na época a respeito de Estética e Ética. Quanto a Felix Krull, minha opinião é que este é antagônico a Gray, representando antes uma moral tão firme que vai além das convenções sociais, permitindo que o personagem mentiroso desde a infância, ladrão e cafetão (até aonde eu li, ele só praticou esses crimes, mas já faz alusões a um futuro em que vai preso), e incorrente em vários outros vicios, inclusive de vaidade, seja íntegro de si para consigomesmo, e de como essa integridade íntima permite-o vingar como um rei em uma sociedade de moralidades fracas.
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