segunda-feira, agosto 27, 2007

Efêmero - O Outro Lado da Parte do Diabo

www.youtube.com/watch?v=swTIIBOsmNw (VÍDEO NO YOUTUBE)

"Você nunca sabe o quanto pode custar uma escolha errada. Eu pensei que tudo fosse ser fácil. Não tinha nada a perder. Eu não tinha nada, mesmo."

"Eu só queria pertencer a esse mundo. Ter grana, um carro legal, umas roupas bacanas. E poder trazer a Lu nesses bares aí, levar ela no cinema, essas coisas. É foda não ter nada. Eu queria ter mais..."


O realista curta-metragem "Efêmero", de Yheuriet Kalil, mostra, de uma maneira hiper-dimensionada, um dos principais problemas da pós-modernidades, relacionado com a socialização entre pessoas super-individualistas. Pode-se fzer um paralelo entre os aspectos mais filosóficos o ponto de vista social desse filme com o livro de Michel Maffesoli (A Parte do Diabo), que eu li no início desse ano, o qual procura exatamente explicar as raízes sociológicas e filosóficas sobre o comportamento dos indivíduos no mundo moderno.

O filme, resumidamente, conta a história de um sujeito simples, um entregador de pizza que, para satisfazer seus anseios materiais e sentimentais (em relação a sua namorada Lu), envolve-se com dois indivíduos para assaltar pessoas na rua. O personagem demonstra durante todo o filme que seu objetivo nos crimes é puramente material, se incomoda com o sadismo de seus companheiros, e sua consciência o atormenta até o final do enredo. Aqui, podemos explicitamente destacar a questão da dualidade entre um individualismo extremado representado pelo desprezo que os personagens tem pelas instituições sociais vigentes, em nome de seus objetivos de curto prazo (o fato de "roubar pessoas na rua para ter grana para levar a sua namorada no cinema"), com um sentimento de inferioridade social, isto é, a angústia demonstrada pela necessidade de "pertencer a esse mundo", e de ser aceito pelos outros indivíduos. Tal dualidade é a chave de toda a ação dos três personagens principais, e cada um deles apresenta um certo grau de consciência de suas ações, que afeta o seu pensar e agir, passando desde o arrependimento do personagem principal, até a psicopatia pura e fria de um dos cúmplices.

O livro de Maffesoli, por sua vez, busca explicar o comportamento individual (e suas conseqüências sociais) na pós-modernidade. Segundo o autor, atualmente os indivíduos agem e pensam de maneira cada vez mais momentânea e isolada. Isto é, o "tipo puro", em uma linguagem weberiana, do indivíduo pós-moderno, é a "criança eterna", que age pelo seu prazer pessoal no período imediato, não se preocupa com as conseqüências de suas decisões e não assume compromissos. Em suma, é um indivíduo que não distingue os princípios do "bem" e do "mal", de acordo com a tradicional moral judaico-cristã. Ou seja, o que vale para suas decisões é o seu prazer máximo, e agora. Segunso Maffesoli, tal indivíduo explica as crises das instituições sociais, a apatia política e intelectual, e o culto ao corpo e à aparência em detrimento ao do trabalho e do comprometimento.

Segundo Maffesoli, tal indivíduo representa não a desagregação da sociedade ocidental, mas uma evolução a uma nova sociedade, que, de acordo com o autor, seria mais pacífica e tolerante que a anterior, já que o "combater o mal", raiz de todas as guerras nas sociedades patriarcais, seria abolido em nome de um "conviver com o mal" moderno, pela aceitação dos diferentes (conseqüência de uma sociedade mais individualista e independente). Ou seja, o autor se mostra otimista com a nova tendência da sociabilidade no mundo ocidental.

Contudo, o filme mostra um outro lado dessa nova sociedade. As coisas não parecem andar tão harmonicamente como Maffesoli imagina. As "crianças eternas" usam a violência para alcançar seus impulsos individualistas, imediatistas e momentistas, que sempre forma associados ao conceito de "Mal" pela moral social tradicional. E, mesmo que a ciência econômica tome como dado que todo indivíduo, em qualquer lugar e em qualquer época, age de acordo com a maximização de seu bem estar esperado, é bem verdade que as pessoas agem dentro de ambientes sócio-institucionais. Isto é, cada indivíduo não é uma ilha isolada, mas suas ações tem conseqüências para seus semelhantes, e, se a sociedade aceita que o bem estar de um pode ser ampliado pelo detrimento do bem estar alheio, certamente, haverão problemas de interação entre os indivíduos.

Obviamente não se defende, aqui, que a sociedade pós-moderna deva ser substituída pela sociedade tradicional. Muito pelo contrário, qualquer um que já tenha lido Aluísio de Azevedo sabe que as instituições vigentes podem ser tão ou mais violentas contra a liberdade e a felicidade individual do que os próprios indivíduos. Além disso, o tempo não pára e não volta atrás, e a interação social responde a comportamentos individuais que variam de acordo com incentivos dinâmicos, e até mesmo, algumas vezes aleatórios. Além disso, comparar indicadores de felicidade individual em diferentes sociedadas simplesmente não faz sentido. Contudo, o filme "Efêmero" nos dá muito menos otimismo sobre a sociedade pós-moderna do que a visão de Maffesoli e alguns outros autores ultra-individualistas.

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