Uma das discussões mais polêmicas sobre o desenvolvimento urbano de Porto Alegre é sobre o projeto de revitalização do Estaleiro Só. A iniciativa privada pretendia construir uma série de edifícios residenciais no local (ver mapa abaixo, assinalado em amarelo), mas as obras dependem da aprovação da prefeitura, cujo processo está tumultuado por uma infinidade de recursos jurídicos.
A discussão sobre a relevância e os impactos da obra é complexa. Tanto as opiniões em seu favor como as contrárias têm uma certa medida de razão. Por um lado, construir prédios de 12 andares (que estão longe de ser considerados arranha-céus em qualquer metrópole brasileira que não Porto Alegre) em uma localidade na beira da lagoa exige cuidados técnicos de segurança e infra-estrutura. Além disso, certamente a obra afetará o urbanismo de sua região urbana, mas isso não me parece um problema, já que o projeto se localiza um uma região meio "morta" da orla do Guaíba, nas proximidades do morro Santa Tereza e do complexo de vilas Grande Cruzeiro. Por outro lado, a liberalização das obras significam mais investimentos, com a geração de empregos, rendas, e maior oferta de imóveis. Além disso, a ocupação privada da área contribuiria para maior segurança do local. Mesmo respeitando as preferências de muitas pessoas em favor da criação de um parque, é bom lembrar que, devido a sua localização, o Pontal do Estaleiro dificilmente seria acessado pela população que vive mais distante.
Por trás dessa discussão, é fácil de se identificar um trade-off entre rigidez de regras urbanísticas e disponibilidade de imóveis na cidade. Explicando melhor, ambos fatores são bens: as diretrizes urbanas previnem a cidade de se tornar caótica ao longo de seu desenvolvimento, ao passo que a maior disponibilidade de imóveis permite que a população consumidora tenha acesso a habitações de menor preço, de acordo com a lei da oferta e da demanda. Por outro lado, regras rígidas tendem a desestimular investimentos, de modo que, quanto mais a prefeitura valorizar o urbanismo, menor será a oferta de imóveis para os cidadãos. Portanto, deve-se explorar esse trade-off com cuidado, sem radicalismos para nenhum lado. Acho necessário que a cidade tenha regras para as construções, limitando os investimentos de acordo com as características e com a infra-estrutura disponível de cada bairro da cidade. Mas também considero importante o processo de verticalização de Porto Alegre como forma de se proporcionar moradias em maior qualidade e quantidade para sua população em crescimento, de modo a não ameaçar as reservas naturais da Zona Sul, e os baixos preços desestimular a expansão de sub-habitações para a população de menor renda.
Infelizmente, esse debate, pelo que li pela Internet, foi tomado por uma politicagem sectária. De um lado, a "direita" pró-prefeitura, defendendo a obra incondicionalmente. De outro lado, a "esquerda", contrária à obra somente para fazer oposição ao governo municipal, escondendo-se por trás de uma retórica vazia de "contrariar os interesses das grandes construtoras". Mesmo que tais posturas são condenadas por participantes sério dos dois pontos de vista do debate, dessa maneira, quem sai perdendo é o cidadão de Porto Alegre.
segunda-feira, novembro 10, 2008
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3 comentários:
Ricardo;
Embora tenha acompanhado a discussão acerca do estaleiro de longe, não acho que o debate tenha ocorrido somente através de uma "politicagem sectária", como disseste, e que os argumentos da "esquerda" ocorram só pela sua oposição à prefeitura.
Pelo contrário, acho os argumentos que tratam da questão ambiental nesse projeto muito sérios e coerentes, e que devem ser tão ou mais considerados quando a praxe "geração de empregos", que sempre se levanta em questões assim por aqueles que defendem empreendimentos a qualquer custo.
E, sinceramente, dizer que a construção de prédios de luxo na orla do Guaíba é uma forma de reduzir os custos dos imóveis para a população da nossa cidade, e de impedir as habitações irregulares em sua periferia, é um tanto ingênuo. Se verticalização e prédios de luxo reduzissem favelas, São Paulo e Rio de Janeiro não seriam o que são.
Abraço!
Dae, Diego!
Não disse que o debate foi dominado apenas por sectarismo, mas notei, pel menos pelo Orkut, que esse comportamente foi muito manifestado.
Sobre a questão do mercado imobiliário, estava pensando puramente em um modelo de oferta e demanda. Aumenta a oferta de imoveis, cai o preço. Mas, como tu lembraste, esses imóveis, no caso, são de luxo. Então, o aumento da oferta beneficiaria a classe alta.
Mas que cidades com políticas urbanísticas rígidas apresentam custos imobiliários mais elevados, isso é fato.
Abraço
Teu post deixou evidente uma coisa que eu já vinha pensando há tempos. Ao que me parece, a maioria dos militantes desta querela, sejam favoráveis ou contrários, estão mais interessados em ver uma "ideologia" sobressair-se à outra do que pela questão em si. É uma postura mais ou menos assim: "Que se dane a orla, o que importa é vencer o debate!"
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