Essa é a ressurreição de um pseudo-crítico literário!
"Caninos Brancos" é o segundo romance de Jack London que eu tive a oportunidade de ler (o outro foi "O Chamado da Floresta"), e o método narrativo, assim como as descrições psicológicas dos personagens, é muito semelhante nas duas obras. O autor descreve a história da vida de animais como se eles fossem seres humanos, isto é, abordando não apenas seu desenvolvimento físico, mas também (e com muita ênfase) sua evolução psicológica e suas emoções e sentimentos. Igualmente, o autor discorre sobre as relações entre os personagens, o meio em que vivem e suas relações com os outros indivíduos (de sua espécie ou não) para tentar explicar os seus comportamentos.
Enquanto em "O Chamado da Floresta" a narrativa descreve a história de um cão doméstico que é roubado e enviado para o Alasca, passando por um incrível processo de adaptação ao meio selvagem e natural, "Caninos Brancos" mostra exatamente o oposto. Agora, a história é sobre um lobo selvagem do norte do Canadá que é domesticado por índios, depois vendido a um dono de rinhas e por fim vendido a um advogado de San Francisco. A ênfase da história é o processo de adaptação, psicológica e emocional, pelo qual o lobo Caninos Brancos passa ao longo de cada fase de sua vida, sendo que esse processo é descrito de forma idêntica ao desenvolvimento de um ser humano.
Assim, vivendo em seu meio natural (o Wild), Caninos Brancos aprende o seu instinto, e as leis da natureza (basicamente, "Comer ou ser comido"). Vivendo com os índios, aprende o senso de Obediência (de um modo como que religioso) com os humanos (descritos como deuses todo-poderosos para os cães) e a Solidão, pela rejeição que sofreu perante os cães domésticos da tribo, por ser um lobo selvagem. Vivendo como lutador com o dono de rinhas, Caninos Brancos aprende o Ódio, e se torna um assassino nato. Por fim, com o último dono, o lobo conhece o Amor, e torna-se perfeitamente adaptado à vida doméstica e entre os sere humanos.
Mas o mais interessante da narrativa de Jack London é a sua maneira de enxergar o desenvolvimento dos indivíduos - animais ou homens. Muitas vezes ao longo do enredo, o autor descreve as potencialidades (principalmente durante a infância, mas presente ao longo de toda a vida) de cada indivíduo como "barro", o qual é moldado pelo meio em que esse mesmo indivíduo vive e pelas relações sociais que pratica, tendo como resultado final as características pessoais e a personalidade de cada um. Tal visão de indivíduo e sociedade remete ao Naturalismo (corrente literária predominante na segunda metade do século XIX), a qual defendia o determinismo do indivíduo pelo seu meio. Mas ao contrário dos autores naturalistas, que viam o determinismo como algo estritamente negativo, que anularia a criatividade e a virtude de cada indivíduo em vantagem dos vícios (ou as "doenças") da sociedade, Jack London tem uma visão mais otimista, destacando a possibilidade de um "determinismo positivo", no caso de um indivíduo, mesmo se for selvagem, se for suficientemente amado e reconhecido pelo seu meio, poder tornar-se virtuoso. No livro, temos o caso de um lobo que era um animal hostil até encontrar o significado do amor e do respeito com seu último dono e sua família.
segunda-feira, outubro 30, 2006
Caninos Brancos - Jack London
Marcadores:
literatura,
Resenhas
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4 comentários:
Oi Ricardo, li "O Chamado da Floresta" e agora fiquei curiosa para ler "Caninos Brancos"!
Você - filósofo -adoraria ler "O velho e o mar" de Ernest Hemingway!
Ótima resenha!
Eu li o conto "Preparando uma fogueira" e fiquei encantada com a qualidade literária de Jack London. Quero muito ler Caninos Brancos também! :)
Um beijo.
Francine Ramos
Numa semana li três livros dele. Andarilho das estrelas, Lobo do mar e Caninos brancos. Estou apaixonada pela narrativa de Jack London. Pretendo ler tudo que puder encontrar. O mais interessante é que o que me remeteu a London foi o livro Na natureza selvagem ( Jon Krakauer ) baseado em fatos reais e cujo personagem era admirador do escritor em questão. Lendo a biografia de J. London, podemos perceber o quanto de sua vida, de forma bem nítida, colocou em sua estórias. Ainda sobre Caninos Brancos, existe um filme que foi pretensamente baseado no livro, é bom, mas se vc desconsiderar como adaptação. Abraços a todos.
Fantástico o estudo
Psicologico nesta obra. A psiquê humana no sentido animal. E muito bem explicado
e inteligível no seu artigo. Parabéns.
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