quarta-feira, agosto 26, 2009

Contra o Método - Paul Feyerabend

Ganhei o mais importante livro do intelectual alemão radicado nos Estados Unidos Paul Feyerabend em dezembro passado. Comecei a ler em janeiro deste ano, mas, devido à pressão para eu terminar minha dissertação de mestrado, acabei deixando de lado, e só concluí a leitura nesta última semana. Meu interesse pelo pensamento de Paul Feyerabend vem desde o segundo semestre de 2007, quando eu cursei a disciplina de Metodologia da Economia no meu curso de mestrado na UFMG, e encontrei os conceitos principais do autor no manual do A. F. Chalmers "O Que É Ciência, Afinal?". Imediatamente, as idéias provocadoras e anarquistas do autor me chamaram a atenção, isto é, concordando ou não, elas me fizeram pensar muito a respeito sobre a natureza da ciência, da academia e do conhecimento humano em geral.

As idéias de Feyerabend, conforme organizadas por Chalmers, podem ser agrupadas em quatro pilares estruturais.

Primeiro, o vale-tudo. Segundo Feyerabend, não existe um método científico universal, isto é, cada ramo da ciência e cada paradigma predominante em cada ramo apresenta suas próprias regras. Além disso, essas regras heurísticas para a condução da atividade investigativa existem exatamente para defender os interesses e as posições sociais dos cientistas engajados nos paradigmas vigentes. Por isso, para que um determinado ramo da ciência progrida, é necessário que os pesquisadores rompam com os métodos vigentes e superem o paradigma predominante. Portanto, para o progresso do conhecimento científico, é necessário que os vanguardistas apelem para o vale-tudo para conquistar espaço frente ao conhecimento estabelecido e aos dogmas vigentes. A demarcação entre os pensadores respeitáveis e os charlatões não precisa de regras metodológicas estritas, mas depende dos próprios resultados das pesquisas realizadas, isto é, os pensadores respeitáveis são aqueles com maior capacidade e interesse de trabalhar em suas teorias de modo a superar qualquer limitação que possa apresentar, ou crítica que possa receber. Já os charlatões se acomodam em defender seus pontos de vista em forma original.

Segundo, a incomensurabilidade. Segundo Feyerabend, a observação de dados, fatos e fenômenos está determinada pela base teórica que cada pesquisador tem em mente. Assim, escolas de pensamento distintas para um mesmo ramo da ciência podem ter intepretações totalmente distintas sobre o mundo real, e os métodos empíricos não são capazes de levar a um consenso. Em alguns casos, os princípios fundamentais de diferentes teorias sobre um mesmo objeto são tão distintos que não há sequer a possibilidade de interação entre elas. Como exemplo, o autor cita a relação entre a mecânica clássica e a teoria da relatividade. Por isso, a escolha por parte de um cientista de determinada teoria a ser seguida não depende de nenhum fator objetivo (como a busca do progresso do conhecimento, em Popper), mas sim de suas próprias preferências subjetivas.

Terceiro, a ciência não é necessariamente superior a outras áreas do conhecimento. Segundo Feyerabend, a superioridade do conhecimento científico frente a outras formas de conhecimento, como a espiritualidade, a religiosidade e o conhecimento popular é sempre assumida como pressuposto, mas nunca demonstrada. Para o autor, isso nunca poderá ser demonstrado, uma vez que os cientistas tendem a investigar essas outras formas de conhecimento seguindo seus próprios métodos, que por sua vez estão viesados em favor dos interesses e do modo de pensar e agir dos cientistas. Para uma comparação mais honesta entre todas as formas de conhecimento humano, seria apropriado comparar a natureza, os objetivos e os métodos de cada uma delas.

Quarto, a ênfase na liberdade individual. Feyerabend assume que o objetivo de sua obra, ao refutar a existência de um método científico universal, é encorajar a ação e a criatividade individuais para aprimorar o conhecimento humano. Isso vale não apenas para o conhecimento dito científico, mas abre a possibilidade dos indivíduos terem a liberdade de escolher qual forma de conhecimento seguir. Segundo o autor, a ciência, se não for contestada e não ter a concorrência dessas outras formas de conhecimento, torna-se uma ideologia dogmática que reprime a ação dos indivíduos em nome dos interesses dos cientistas e acadêmicos em geral.

Em relação a minha opinião pessoal sobre as idéias de Feyerabend, tento ser conciliador. Em primeiro lugar, com base em meus estudos e pesquisas em metodologia da ciência, concordo que não há um método científico universal além de definições muito genéricas do tipo "o conhecimento científico deve partir de uma teoria logicamente consistente e passível de comprovação ou refutação com base em testes empíricos". Porém, não estou apto a afirmar se a história do pensamento da humanidade segue a lógica dialética (há um paradigma vigente (tese); ele sofre críticas (antítese); ele pode ser derrubado e substituído por algo proposto pelos seus críticos (síntese)) proposto pelo autor. As revoluções científicas, conforme proposto por Thomas Kuhn, de mudança de paradigmas nos ramos da ciência geralmente seguem essa lógica, mas acho muito importante o progresso linear do conhecimento dentro dos paradigmas, mesmo com suas limitações.

Também concordo com o autor a respeito da dependência que as investigações empíricas têm das proposições teóricas que os pesquisadores seguem. Isso é ainda mais relevante para as ciências sociais, em que muitas das hipóteses levantadas pelas teorias simplesmente não são passíveis de teste, e a conduta de pesquisa tem um caráter mais lakatosiano (de defesa de um "núcleo irredutível" de hipóteses metafísicas). Mas, nem por isso, nego a importância fundamental dos métodos empíricos para o conhecimento humano, apenas defendo que eles devem sempre estar de acordo com um determinado aracabouço teórico, que possa explicar as observações realizadas.

Em relação à escolha por parte dos pesquisadores a respeito de qual corrente teórica seguir, estou mais com Imre Lakatos do que com Feyerabend. O que realmente conta são os interesses futuros, isto é, os pesquisadores estão, em geral, inclinados a se integrar em linhas de pesquisa que possam lhes trazer sucesso profissional, e esses movimentos de pesquisadores em busca do interesse próprio ajudam a explicar a história do pensamento. Os desejos subjetivos metafísicos, conforme proporsto por Feyerabend, têm papel secundário.

Por fim, considero que o debate sobre se a ciência é realmente superior a outras formas do conhecimento vem sendo super-dimensionado. Na verdade, a ciência é realmente superior as demais formas de conhecimento naquilo que propõe fazer, isto é, procurar teorias logicamente consistentes e passíveis de teste empírico. Por outro lado, nem todo o conhecimento humano é passível de ser testado, sobretudo no que diz respeito às ciências sociais, às humanidades e à filosofia (daí meu grande interesse sobre o pensamento de Imre Lakatos, que leva essa consideração em conta). Por isso, nas questões em que a ciência não se propõe a explicar e resolver, tenho muito respeito pelas demais formas do conhecimento, particularmente pela filosofia (no caso de reflexões subjetivas qualitativas não necessariamente empíricas), e pelas artes em geral (no caso da busca de livre expressão, interpretação e criatividade individual, sem necessidade de arranjos lógicos e de empiricidade).

Nesse ponto, considero que Feyerabend, ao tentar polemizar, acabou se excedendo. Ao invés de defender as ciências sociais e a filosofia contra a metafísica de um método científico universal, que são suas áreas de atuação, assim como da maior parte de seus leitores, o autor se prende demasiadamente à defesa de culturas minoritárias (como o vodu, citado pelo autor), da astrologia e da religiosidade, sem levar em conta que tais vertentes tem pouca ou nenhuma correlação com o conhecimento científico, como objetivos e métodos definidos. Nesse ponto, estou de acordo com a crítica de Chalmers. Por último, também achei de mal gosto o autor dedicar um capítulo inteiro da obra procurando defender a Inquisição Católica contra Galileu, mesmo Feyerabend não sendo um conservador.

De qualquer forma, o que interessa é que Feyerabend é provocador e faz com que seus leitores pensem, reflitam, concordem em alguns pontos e explodam de indignação em outros. É exatamente isso que justifica a leitura dessa obra.

domingo, agosto 23, 2009

Novidade na Blogosfera Econômica

Dou boas vindas ao mais novo integrante da blogosfera econômica brasileira. Controvérsias Econômicas, assinado por Arthur, um auto-intitulado economista de esquerda da PUC-RJ.

Desenjo muito sucesso.

O Desenvolvimento Econômico Brasileiro Explicado pelo Modelo de Solow

Texto extraído da minha prova final de Macroeconomia II:
I – Revisite a História Econômica do Brasil a partir de 1950, discutindo o alcance do modelo de Solow ampliado para explicar três dos principais movimentos na sua renda per capita (no mínimo analisar períodos de cinco anos).

De acordo com o modelo de Solow, o crescimento econômico é explicado pela acumulação de dois fatores de produção, o trabalho e o capital. Considerando-se o fator trabalho como constante, o capital é acumulado pela diferença entre o investimento per capita, que depende da propensão a poupar por parte dos agentes econômicos, e a taxa de depreciação do capital já instalado na economia. Além disso, supõe-se que o capital tem rendimentos marginais decrescentes, de modo que, quanto mais desenvolvida for a economia, menor será sua lucratividade, tanto devido aos maiores custos fixos dos investimentos, como também pela maior concorrência entre as firmas proprietárias do capital. Desse modo, o crescimento do produto per capita tende a convergir para um estado estacionário, no qual a acumulação de capital só é suficiente para cobrir a depreciação.

Em um modelo de Solow ampliado, supõe-se a existência de um progresso tecnológico exógeno e de taxas constantes. Esse progresso tende a elevar a produtividade do trabalho, mesmo no longo prazo, em um processo descrito como “acumulação de trabalho efetivo”. Assim, no estado estacionário, este é o único fator capaz de provocar crescimento do produto per capita.

Na economia brasileira, durante o período de 1952 a 1960, em que se aprofundou o chamado Processo de Substituição de Importações (PSI), Bacha & Bonelli (2001) elaboraram um estudo sobre a contabilidade do crescimento econômico no país. Segundo os autores, nesse período, 60,1% do crescimento se deu por ganhos de produtividade da mão-de-obra, sendo que, nesse caso, 21% se deu devido à absorção tecnológica, e 42% é explicado pelo crescimento populacional.

Os mesmos autores, em um artigo de 2005, elaboraram um estudo mais histórico a respeito do desenvolvimento econômico do Brasil. Nesse artigo, Bacha & Bonelli associaram o governo Vargas (1950-1954) a um arranjo institucional favorável a políticas de valorização do café, para beneficiar o setor exportador, e políticas protecionistas para a industrialização, como a criação do BNDES e da Petrobrás. Ou seja, mesmo que o modelo de Solow não capte efeitos de mudanças institucionais na economia, parece lógico que foi adotada no Brasil uma estratégia de crescimento baseada no aprofundamento do capital, apesar de frustrada por instabilidades de cunho político.

Por outro lado, durante o governo Juscelino Kubitschek, o protecionismo industrial, pela substituição da importação de bens de consumo duráveis, se deu devido ao incentivo aos investimentos diretos estrangeiros. Dessa maneira, o crescimento econômico do Brasil passou a ser guiado pela absorção do progresso tecnológico internacional. Todavia, os autores deixam claro que, em ambos os governos, o crescimento econômico doi possibilitado por um aumento da taxa de poupança interno.

A crise financeira que estancou o processo de crescimento econômico no Brasil no início da década de 80, se deu em um contexto de pesado endividamento externo e de aceleração inflacionária no país. De acordo com Bacha e Bonelli (2005), a aceleração inflacionária foi conseqüência da excessiva demanda doméstica, aquecida pelos investimentos estatais maciços durante o segundo Plano Nacional de Desenvolvimento, como também pela indexação de preços e de salários.

Os autores refutam a hipótese de que a crise durante esse período tenha sido causada por uma redução da taxa de poupança doméstica. Segundo os dados de seu estudo, a taxa de poupança na década de 80, mais especificamente até 1986, se manteve estável em torno de 15% do PIB, isto é, em um nível superior aos dos 15% do período de 1947 a 1965, um período marcado pelo forte crescimento econômico. O que teria ocorrido, na verdade, foi uma quebra estrutural na relação entre a taxa de poupança e a acumulação de capital, no sentido de que a mesma taxa de poupança tenha gerado cada vez menos capital acumulado e crescimento do produto.

Em relação a essa quebra estrutural da relação poupança-crescimento, os autores elaboraram duas hipóteses teóricas. Em primeiro lugar, poderia ter ocorrido um encarecimento do preço relativo dos investimentos no país, o que pode ser representado como uma “regressão tecnológica” no modelo de Solow. Esse fator foi causado pelo maior poder de monopólio das indústrias produtoras de bens finais de investimento, por ineficiências intrínsecas ao Processo de Substituição de Importações de bens duráveis, ocorrido no período imediatamente anterior, e por uma maior demanda por bens duráveis, como uma alternativa de investimento privado de segurança contra a inflação, que teria elevado o preço relativo desses bens, e desestimulado investimentos na capacidade produtiva. Em segundo lugar, poderia ser um reflexo da produtividade decrescente do capital, que, apesar de ser um processo logicamente previsto no modelo de Solow, foi acentuado no caso brasileiro. Segundo os autores, isso decorre das próprias características do modelo de crescimento econômico adotado no Brasil desde a década de 50, baseado em investimentos intensivos na acumulação de capital, com forte presença de indústrias monopolísticas e oligopolísticas.

Complementando as hipóteses levantadas por Bacha & Bonelli, Adrogué et al. (2006) apontam como mais um fator que influenciou o estancamento do crescimento econômico brasileiro nessa década o crescimento dos gastos públicos. Segundo esse estudo, o crescimento das despesas governamentais foi direcionado ao consumo, o que exerceu um efeito de crowding out sobre o setor privado, isto é, de restrição de gastos devido ao aumento dos impostos e a absorção de poupança no mercado de crédito.

Nos anos noventa, com a consolidação do Plano Real e da estabilidade de preços no Brasil, houve uma recuperação do crescimento econômico, mas ainda em níveis muito inferiores aos vistos nas décadas de 50, 60 e 70. De acordo com Bacha & Bonelli (2001), a contabilidade do crescimento econômico no país no período de 1993 a 2000 foi de 40% baseado na acumulação de capital, e 60% causado por progresso tecnológico.

Como causas da breve recuperação do crescimento econômico, a literatura cita as reformas implementadas no período, tais como a abertura comercial e financeira, a estabilização de preços e a reforma do Estado. De acordo com Adrogué et al. (2006), a combinação da liberalização do comércio internacional com a adoção de taxas de câmbio flexíveis se traduziu em uma maior abertura da economia brasileira, o que permitiu maior acesso à tecnologia estrangeira. Além disso, as reformas no setor financeiro, também associadas a melhorias tecnológicas no modelo de Solow, propiciaram maior estabilidade aos títulos, ao passo que permitiu a expansão do crédito para investimentos. Por fim, os investimentos do governo em infra-estrutura contribuíram por controlar o crescimento do preço dos investimentos, fator que restringiu o crescimento econômico brasileiro na década de 80.

De acordo com Bacha & Bonelli (2001), nesse período a taxa de acumulação de capital necessária para promover um mesmo crescimento do produto foi menor do que na década anterior devido a dois motivos. Em primeiro lugar, o progresso tecnológico absorvido do exterior, graças à abertura econômica. Em segundo lugar, a redução do crescimento populacional, que reduz o ritmo do crescimento do produto per capita. Contudo, nesse último caso, de acordo com Pessôa (2006), a transição demográfica brasileira pode ser restringida pela desigualdade educacional, uma vez que os mais pobres costumam ter mais filhos e em idade mais jovem do que os demais integrantes da sociedade, além de investir menos no capital humano de sua prole. Por isso, o autor recomenda que, para que o crescimento econômico possa ser acelerado no Brasil em um futuro próximo, são fundamentais investimentos na qualidade da educação e na universalização do ensino infantil no país.

Por fim, segundo Bacha & Bonelli (2005), a contribuição do trabalho bruto foi muito pequena para o crescimento econômico brasileiro na década de noventa. Ou seja, a absorção de mão-de-obra no país foi muito baixa. Segundo os autores, uma possível causa para esse problema é o fato de que a acumulação de capital no período não acompanhou apropriadamente o progresso tecnológico, isto é, faltaram investimentos para a criação de empregos.

terça-feira, agosto 11, 2009

Uma Alternativa ao Senado Federal Brasileiro: O Modelo Alemão (2)

O post anterior, na verdade uma resenha que escrevi em 2004, na minha época de graduação, pode ser resumido no seguinte parágrafo:

"Um dos órgãos que definem o entrelaçamento político e institucional entre as instâncias de governo da Federação Alemã é o Conselho Federal (Bundesrat). Este é um órgão pelo qual os laender participam ativa e diretamente do processo legislativo federal, servindo como um contrapeso ao governo e ao Parlamento Federal, os maiores órgãos legislativos da União. O Conselho Federal é composto por membros nomeados pelos governos estaduais, de modo que haja consenso entre os representantes de um mesmo Estado para tomadas de decisões em bloco. Assim, há uma estreita concordância entre governos estaduais e seus representantes no Conselho Federal."

Ou seja, na Alemanha, o órgão que deswempenha o papel político do Senado, isto é, de representar eqüitativamente os interesses estaduais (laender, no caso alemão) é o Conselho Federal. Ao contrário do caso brasileiro, os integrantes do Conselho Federal são escolhidos pelos governos estaduais, e não eleitos por voto direto.

Pois é isso que eu proponho para que se resolva o caos institucional a que chegou o Senado brasileiro. Trocaria-se o Senado por um Conselho Federal, cujos membros seriam indicados pelo governador e/ou pela Assembléia Legislativa de cada estado. Cada estado teria um único representante nesse conselho, cujo cargo seria chamado, digamos, de "Secretário de Assuntos Federais", e teria competência semelhante aos demais secretários estaduais (como da fazenda, da saúde, da segurança, etc.). Esse modelo, ao meu ver, traria uma série de benefícios à política brasileira.

Em primeiro lugar, os Secretários de Assuntos Federais seriam um só por estado, e financiados pelos orçamentos públicos estaduais. Isso reduziria o desperdício de dinheiro público, não só pela menor oferta de cargos, mas também porque os estados têm menos dinheiro do que o Governo Federal.

Segundo, essa proposta garante que os interesses dos governos estaduais estejam representados no conselho. Os governadores e/ou as Assembléias Legislativas indicariam os secretários de sua confiança e, caso não correspondam, podem ser demitidos e substituídos como qualquer outro secretário estadual. Dessa maneira, o novo Senado teria o seu papel designado pela Constituição Federal, e deixaria de ser uma mera "Câmara dos Deputados de Elite", alvo dos interesses eleitorais e financeiros dos partidos e da cooptação pelo governo federal.

Terceiro, há um menor incentivo à impunidade frente a corrupção. Se um secretário for pego em algum escândalo, isso certamente respingaria na opinião pública sobre o governo estadual que o indicou. Sabe-se que a opinião pública é muito mais implacável quando a sujeira política é mais próxima do eleitor. Por exemplo, a atual crise no Senado não provocou nenhum protesto popular, e muitos senadores, apesar de terem fichas sujas há muito tempo, tendem a ser reeleitos. Por outro lado, o ex-governador do Rio Grande do Sul Germano Rigotto deu um tiro na própria carreira política ao propor um aumento de impostos, medida que ainda que impopular, não é ilegal. Assim, os governadores e deputados estaduais não gostariam de ter suas carreiras ameaçadas pela imoralidade de um secretário, e tenderiam a demiti-lo sem burocracias paralisantes (como o Conselho de Ética, por exemplo).

Por fim, muitos podem pensar que tal proposta reduziria as instituições democráticas do Brasil, já que substitui o voto direto para Senador por um mecanismo de voto indireto. Todavia, os membros dos governos estaduais (governadores e deputados), que indicariam o "Secretário de Assuntos Federais", são eleitos por voto direto pela população. Além disso, esse cargo de secretário teria um viés mais técnico do que político, se igualando as demais secretiarias estaduais, e se vinculando totalmente aos interesses dos governos estaduais.

Essa é só uma idéia minha. De qualquer forma, acho que o atual modelo de Senado Federal brasileiro não pode ficar pior do que já está.

Uma Alternativa ao Senado Federal Brasileiro: o Modelo Alemão

Durante minha graduação, trabalhei como pesquisador em economia do setor público, mais particularmente na linha de federalismo fiscal. Fiquei um semestre inteiro, pelo menos, estudando as bases institucionais do federalismo alemão, com ênfase nos mecanismos de entrelaçamento político entre as esferas de governo (federação, estados e municípios). Acho que o modelo alemão tem muito a ensinar ao caso brasileiro, sobretudo após a avalanche de escândalos que sepultou a imagem pública do Senado Federal.

O sistema federalista alemão, baseado nas relações cooperativas entre as esferas governamentais, tem a sua eficácia institucional viabilizada pela existência de órgãos competentes para resolver conflitos de interesses entre as diferentes esferas. Esses órgãos são, basicamente, arenas decisórias conjuntas, onde cada esfera mantém seus representantes para defender os seus interesses. Além disso, há a existência de um poder moderador, exercido pelo Tribunal Constitucional Federal, para julgar as disputas entre as unidades políticas conforme os princípios da Constituição Federal.

Assim como ocorre na atividade financeira do Estado alemão, onde há um federalismo fiscal baseado no entrelaçamento financeiro entre União e laender, de modo que o princípio de garantia de um mínimo de condições homogêneas de vida em todo o país seja respeitado, no aparelho político-institucional do Estado alemão também ocorre um entrelaçamento entre as esferas de governo. Nesse caso, o entrelaçamento político tem a importância de realizar tomadas de decisões conjuntas entre União e laender, assim como promover a execução de políticas administrativas e planejamento orçamentário em conjunto.

Um dos órgãos que definem o entrelaçamento político e institucional entre as instâncias de governo da Federação Alemã é o Conselho Federal (Bundesrat). Este é um órgão pelo qual os laender participam ativa e diretamente do processo legislativo federal, servindo como um contrapeso ao governo e ao Parlamento Federal, os maiores órgãos legislativos da União. O Conselho Federal é composto por membros nomeados pelos governos estaduais, de modo que haja consenso entre os representantes de um mesmo Estado para tomadas de decisões em bloco. Assim, há uma estreita concordância entre governos estaduais e seus representantes no Conselho Federal.

O Conselho Federal, dentro de seu papel de proteger os interesses de cada Estado no poder legislativo federal, trabalha através de uma série de comissões permanentes. Essas comissões consistem em associações de delegados de todos os Estados da federação com o objetivo de estudar e discutir os projetos de lei elaborados no Parlamento, de acordo com seus próprios interesses. Um exemplo dessas comissões permanentes é a comissão de finanças, a qual trabalha com as finanças públicas e os orçamentos definidos para as instâncias de governo.

A legitimidade do Conselho Federal, em resumo, advém de sua função de entrelaçar o poder Executivo dos estados, os quais nomeiam seus representantes, junto ao poder Legislativo federal. Assim, o Conselho Federal exerce um aconselhamento técnico junto à União, com o objetivo de entrelaçar os interesses estaduais e federais e realizar políticas de mútua responsabilidade entre as esferas.

Assim como os laender podem intervir nas políticas federais através do Conselho Federal, o poder central também pode intervir e monitorar as ações dos estados. Pois, como a maior parte da legislação alemã é elaborada pela União e administrada pelos estados, cabe à União a monitoria da administração pública, como forma de preservar o processo e os meios de execução dessas leis e os gastos públicos decorrentes de tais atividades pelos laender. Para isso, cabe à União elaborar comissões de planejamento do gasto público das diferentes esferas de governo.

Um exemplo de intervenção do governo federal sobre as competências estaduais se dá na administração tributária. Nesse caso, mesmo que os principais impostos cobrados no país sejam o Imposto de Renda e o Imposto sobre Valor Agregado, de distribuição compartilhada entre União e laender, a regulamentação sobre sua cobrança é determinada por legislação federal. O objetivo é garantir uma uniformidade e uma padronização de regulamentos em todas as unidades subfederais do Estado alemão, para isso exercendo uma restrição à autonomia administrativa das mesmas. Assim, pode-se conseguir uma mesma organização da administração financeira em todos os estados subnacionais e impor um mesmo tratamento aos contribuintes em todo o território alemão.

Outra vantagem da regulamentação federal sobre a administração tributária alemã está na capacidade de se tomar decisões mais rapidamente em caso de disputas intergovernamentais, e de modo unificado, preservando-se dessa maneira a padronização da regulamentação entre os Estados.

Um outro exemplo de entrelaçamento político e institucional na Alemanha se dá no planejamento do gasto público. Essa é uma atividade que visa, acima de tudo, preservar a estabilização econômica e de preços e o fornecimento de bens e serviços públicos necessários e de qualidade satisfatória à população do país. O órgão máximo a coordenação dos gastos públicos intergovernamentais é a Comissão de Planejamento Financeiro (Finanzplanungsrat), formada por representantes da União, dos laender e dos municípios. Esse órgão encarrega-se de discutir e resolver impasses como as necessidades de receitas para cada esfera governamental, o endividamento público tolerável para essas esferas e a qualidade dos gastos públicos efetivados, em investimentos e produção de bens públicos. A importância da representação das três esferas de governo nessa Comissão está na necessidade de se ter uma visão geral e abrangente sobre a coordenação do orçamento público, podendo-se com isso fixar uma política fiscal ao mesmo tempo ativa e responsável para cada nível de governo.

Outro importante órgão para o planejamento dos gastos públicos é o Conselho Conjuntural para o Poder Público, o qual tem o objetivo de promover a estabilidade de preços, o crescimento econômico sustentado, o pleno emprego e o equilíbrio das contas externas nacionais. Seu poder é de caráter meramente consultivo, servindo de base para as políticas aprovadas pelo Conselho de Planejamento Financeiro.

Por fim, um outro órgão de planejamento financeiro estatal se dá através das Comissões de Planejamento Relativas às Funções Compartilhadas. Esse órgão trata de definir os investimentos públicos nas áreas onde ocorre o compartilhamento de funções entre União, laender e Municípios, como o ensino superior, a infra-estrutura econômica regional e as políticas agrárias.

Já o Tribunal Constitucional Federal é um órgão constitucional federal independente das esferas de governo e de poder. É, em suma, uma instância à qual todo o cidadão ou organização alemã pode recorrer, para discutir e verificar a constitucionalidade dos atos de outros cidadãos e organizações oi da aplicação de uma lei pelo poder público. O Tribunal Constitucional Federal fiscaliza as atividades dos órgãos de Estado e dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Assim, serve como um poder Moderador, controlando os excessos dos demais poderes, e resolvendo disputas entre eles. Porém, para que o seu enorme poder não ameace as instituições democráticas alemãs, o Tribunal Constitucional Federal só entra em ação quando um agente político recorre às suas funções. Enfim, o papel desse tribunal é essencial para a consolidação do arranjo federativo alemão, através de sua função de harmonizar os interesses e resolver disputas entre as esferas governamentais, verificando a constitucionalidade, quando solicitado, de cada lei aprovada ou de cada ação administrativa tomada por tais esferas.

segunda-feira, agosto 10, 2009

Sobre o Arquivamento das Denúncias contra José Sarney

Do Senado, eu já não espero mais nada. Já sabia que José Sarney, o pior presidente da história do Brasil e lorde dos feudos do Maranhão e do Amapá, seria inocentado pelos seus colegas.

Essa história pelo menos conseguiu escancarar mais um parasita do Senado Federal: o carioca Paulo Duque, não surpreendentemente, do PMDB. Lendo pelos blogs por aí, descobri que ele é pau-mandado do Renan Calheiros. De acordo com o Blog do Oliveira,

No Império Romano, como se sabe, duque era o título dado aos comandantes militares das províncias.
No ducado do Conselho de (a)Ética do Senado, Duque comanda as tropas do imperador Renan Calheiros, o bárbaro.


Mas a melhor parte da última bateria de escândalos no Senado foi o bate-boca entre seus integrantes. Collor reafirmou sua insanidade boçal ao quase espumar pela boca quando discutiu com Pedro Simon. Renan Calheiros e Tasso Jereissatti travaram um combate no qual ambos tinham absoluta razão em suas afirmações: Tasso é mesmo um "coronel de merda", tal como acusado pelo colega alagoano; Renan é mesmo um cangaceiro, não de terceira, mas de primeira categoria. Nessas horas, invejo muito os políticos sul-coreanos e suas estratégias ninjas de debate. Uma boa porrada, sobretudo com Renan Calheiros apanhando, seria a melhor coisa que os Senado prestaria à população brasileira nos últimos tempos.

quarta-feira, agosto 05, 2009

Lula Cria a Emobras

Charge que recebi por e-mail (clique para ampliar):

terça-feira, agosto 04, 2009

Fotos do Gasômetro

Na minha última sexta-feira de férias em Porto Alegre, resolvi encarar o frio e subi no terraço da Usina do Gasômetro, na beira do lago Rio Guaíba, para conhecer a vista. Muito bela, por sinal. Abaixo, as fotos que tirei.





Meu "talento fotográfico" me custou uma febre de 39 graus nesse dia. Será que valeu a pena?