segunda-feira, julho 16, 2007

Review - Loco Live (Ramones)

De volta às minhas divagações!

Do you remember lying in bed
With your covers pulled up over your head?
Radio playin' so no one can see
We need change, we need it fast
Before rock's just part of the past
'Cause lately it all sounds the same to me


Loco Live, dos Ramones, muito provavelmente é um dos discos mais influentes de toda a história do Rock. Foi gravado ao vivo em Barcelona, Espanha, em 1991, e contém os 33 maiores sucessos dos Ramones até então, incluindo todos os grandes clássicos da banda. Pessoalmente, eu adquiri esse disco em meados de novembro de 2001, na famosa loja de discos semi-novos "Porto Alegre Discos", na Galeria Chaves, trocando por dois antigos discos meus de pop nacional, sem mais especificações, que eu gostava de ouvir antes dos 15 anos de idade.

Em primeiro lugar, destaco que Loco Live é um desses discos que, tal como "Nevermind" do Nirvana, todo mundo tem, já teve, ou já pegou emprestado por muito tempo. É um disco sempre presente na estante de qualquer fã de, não apenas punk rock, mas de rock and roll em geral, e essa é uma observação empírica já pessoalmente comprovada. Amigos e conhecidos meus, quando perguntados se curtem o som dos Ramones, muitas vezes apenas comentam: "Bom, eu tenho o Loco Live...".

Em segundo lugar, não há nenhuma objeção ao papel que os Ramones desempenharam para a história do Rock, sendo que, na maioria dos levantamentos, os Ramones competem lado a lado com os Rolling Stones na disputa pelo posto de segunda banda mais importante de todos os tempos (a primeira sempre é Beatles, sem excessões). Ramones é muito mais do que uma banda, é um gênero musical (mais agressivo que rock'n'roll, menos "foda-se-o-sistema-sou-anarquista" do que o punk-hardcore em geral), e um estilo de vida para muitas pessoas, caracterizado pelo uso contínuo de tênis All-star imundos, jeans sebosos, camisas pretas desbotadas embaixo de jaquetas de couro ou camisas sociais largas, e, sobretudo, o espírito de ser jovem, comprar uma guitarra vagabunda usada e ter o sonho de montar uma banda e "salvar o rock". Bandas amadoras ramoníacas, compostas por indivíduos de "Ramones way of life" encontram-se aos milhares em Porto Alegre e em qualquer grande cidade do Brasil (não sei se também do mundo), e se reúnem semanalmente em lugares igualmente característicos, como Garagem Hermética e Porto de Elis, para tocar seus covers favoritos, e para pular e cantar junto ao som dos mesmos covers, tocados pelas outras bandas.

É óbvio que os fãs de Ramones são apenas um grupo pequeno de identidade para os jovens habitantes das cidades ("Esses monstros", segundo Michel Maffesoli), e dividem espaço com emos, lutadores de jiu-jitsu, surfistas, góticos, patricinhas, ravers, rasta-faris, e mais algumas dezenas de grupos. Contudo, os ramoníacos em geral se destacam por uma característica bastante interessante: sua adesão ao "way of life" padrão do grupo é completamente voluntária e espontânea, é como se pessoas tivessem predisposição genética a se tornar um fã dos Ramones após atingir determinada idade na adolescência. Isto é, não há pressão publicitária nenhuma, e social-cultural-familiar tampouco para que uma pessoa adote a identidade de fã dos Ramones; suas músicas não tocam nas rádios (fora Pet Cemetery, e muito raramente), as pessoas conhecem a banda ou pela Internet, ou pelo contato com um outro prévio fã de Ramones, e as idéias da identidade que passa a se manifestar são puramente espontâneas, como se estivessem presas no subconsciente da pessoa e a partir do contato com o som da banda, se libertam.

Mas que idéias são essas, características dos ramoníacos, isto é, presentes em milhares de pessoas que voluntária e espontaneamente se olham para um espelo e dizem com orgulho "eu admiro os Ramones", sem ter nenhum incentivo externo para isso além da banda em si? Ser fã de Ramones é desejar ser um "Teenage Lobotomy". É acreditar em milagres. É não ter medo da vida. É não se importar. É não querer ser domesticado. É não querer crescer. É querer estar sedado. É desejar ter o teu amor hoje, para amanhã pensar em dominar o mundo. É ser duro demais para morrer. É não querer ser insultado por todos aqueles que se sentem superiores: Picked up the magazine, I see your face. You're nothin' boy, a goddamn waste. With the lamest fashions on your back, You're never happy, a hypochondriac. É querer viver a sua própria vida.

Em resumo, Loco Live é uma coletânea dos maiores sucessos, para os fãs, é claro, da banda, tocados ao vivo. O som é bem mais agressivo do que o dos álbuns de estúdio, mesmo para as músicas de apelo mais pop, como "Pet Cemetery" e "Bonzo Goes to Bitberg". As músicas, com poucas excessões, são na base do "One Two Tree Four" do Dee Dee, entra a bateria, depois o baixo, depois a guitarra, depois o Joey canta, e tudo não dura muito mais do que dois minutos por faixa. E essa é uma das características que mais cativa os fãs dos Ramones, a atitude do "deixa-de-frescura-e-vamos-direto-ao-assunto". É claro, como todo disco ao vivo de maiores sucessos de um banda de longa carreira, Loco Live sempre recebe críticas dos fãs mais bitolados da banda por não ter a música X ou Y, que "não poderia deixar de ter". De minha parte, por exemplo, achei que faltou "53rd and 3rd". Mas esse disco já contém 33 faixas que contam a história, a atitude e as idéias da banda que deixou um verdadeiro sentimento de devoção por parte de seus fãs, e muitas páginas na história da música popular contemporânea, em nível mundial.

Um comentário:

D disse...

Meu comentário prometido, em poucas palavras: ótima crônia.

Duas objeções: 1) Nem todo ramoníaco usa "tênis All-star imundos, jeans sebosos, camisas pretas desbotadas embaixo de jaquetas de couro ou camisas sociais largas". Alguns são economistas. 2) Dizer que os fãs de Ramones "dividem espaço com emos, lutadores de jiu-jitsu, surfistas, góticos, patricinhas, ravers, rasta-faris" foi sacanagem.

Abraço.