Quem se deu conta da nova situação foi o micro-empresário britânico Malcolm McLaren, que tomou conhecimento da cena minimal em uma viagem a Nova York em 1973. Segundo Bivar (pg. 42-43),
... Malcolm McLaren volta a Londres consciente de algumas coisas relevantes: a) que músicas com mais de dois minutos de duração e letras que falassem dos problemas sociais urbanos tinham um futuro; b) que valia a pena praticar a política situacionista, de confrontos e controvérsias, assim como produzir eventos e gestos que polarizassem atitudes; c) que, resumindo, ele estava muito avançado para Nova Iorque, e que Londres continuava sendo o celeiro ideal para laboratórios artísticos de vanguarda.
Ou seja, havia mercado para o surgimento de bnadas de rock que refletissem a situação dos jovens diretamente afetados pela crise mundial de 1973, com músicas simples e agressivas, já que poucos ainda tinham dinheiro para investir em equipamentos musicais sofisticados e até mesmo em aulas de música. Assim, McLaren contrata quatro amigos para fundar o lendário grupo Sex Pistols, dando início ao movimento punk.
Daí até o final do livro, Bivar faz relatos sobre as histórias específicas das principais bandas punk, especialmente dos Sex Pistols. O livro perde seu caráter histórico e se torna uma publicação destinada especificamente para os fãs dessas bandas, o que é de interesse secundário para mim. Por fim, ao descrever como o movimento punk chegou ao Brasil, o autor dá a entender que foi de maneira muito semelhante a que ocorreu lá fora, mudando a cidade e a crise em vigor. Saem Londres e o primeiro choque do petróleo de 1973, chegam São Paulo e o colapso do modelo de substituição de importações, no início da década de 80. De resto, a descrição do surgimento do movimento permanece muito semelhante nos dois casos: são massas de jovens trabalhadores urbanos desempregados que, revoltados e empobrecidos pela situação, adotam um padrão estético e cultural de confronto agressivo contra o que está estabelecido, e lutam (com certo sucesso) pela sua aceitação perante aos setores mais conservadores da sociedade, que os conideram meros arruaceiros marginalizados.
Uma crítica pessoal que posso fazer à análise histórica feita pelo autor (que foi meu maior interesse ao ler esse livro) é a sua total desconsideração da cena novaiorquina (principalmente dos grupos Ramones e do próprio New York Dolls), não apenas como a verdadeira originária do movimento punk, mas também como tendo qualquer importância nesse sentido. É de conhecimento público que Malcolm McLaren teve contato com ambas as bandas em sua viagem a Nova York em 1973. E, nessa época, os Ramones já eram tudo aquilo que o autor descreve dos primórdios do movimento punk: jovens pobres, revoltados com a sua situação e com a cena musical predominante no seu tempo, e que, graças a suas restrições orçamentárias, fazem músicas rápidas, simples e agressivas divulgando suas idéias. E os Ramones fizeram isso espontaneamente.
Acho que, pelo menos em parte, isso decorre de um preconceito que muitos intelectuais brasileiros tenham em relação aos Estado Unidos. Os nossos pensadores tendem a associar toda a cultura norte-americana a produção em massa de bens de consumo imediato, sem preocupações com a qualidade e a expressão, mesmo sem estudá-la seriamente. A contra-cultura e o progresso da liberdade de expressão, com a inclusão dos jovens e das classes sociais menos favorecidas, parecem relegadas como que de maneira mística, seguindo leis históricas inequívocas, à França revolucionária ou à Inglaterra operária.
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