A uma semana das eleições gerais no país, o cenário político que se configurará a partir do ano que vem já está praticamente decidido. Primeiro, Dilma Rousseff será eleira presidente, muito provavelmente no primeiro turno. Segundo, os políticos dos partidos da base do governo (PT, PMDB, PDT, PSB, PR, entre outros) deverão obter a maioria no Congresso, em ambas as câmaras, e devem levar a maioria dos governos estaduais.
Apesar dos escândalos de corrupção que estão estourando às vésperas do pleito, a maior parte do eleitorado ficará com os candidatos do governo. A meu ver, isso se deve à conjuntura macroeconômica vigente, isto é, a taxa de desemprego excepcionalmente baixa e o nível de consumo das famílias aquecido. Isso ocorre porque no Brasil a única fonte de rendimentos para a maior parte das famílias é o trabalho, de modo que a sua percepção de bem-estar esteja vinculada ao ciclo econômico. Além disso, outras variáveis que sejam significativas para as eleições no Brasil (para a classe baixa, o acesso às transferências públicas de renda; para as classes média e alta, a probabilidade de novos concursos públicos) claramente beneficiam os candidatos do atual governo federal. As questões referentes à ética na gestão pública e ao planejamento do crescimento no longo prazo - por investimentos sobretudo no capital humano e no marco regulatório - que são vantajosas à oposição, não seduzem o público. Isso se deve certamente ao baixo nível educacional do eleitorado brasileiro (sobretudo em termos de qualidade), e à conseqüente vulnerabilidade dessas pessoas ao ciclo macroeconômico (tal como demonstrei na minha dissertação de mestrado), elas tendem a preferir o curto prazo em detrimento ao futuro.
No ano que vem, a aliança partidária que sustenta o atual governo federal se sairá fortalecida. Com a maioria no poder Legislativo, o governo poderá implementar reformas estruturais (como a reforma política, a tributária e a trabalhista). Todavia, tal maioria poderá aumentar o risco do governo tomar medidas consideradas autoritárias, de maior regulação estatal sobre a vida das pessoas. Esse risco pode ser contrabalanceado de acordo com o comportamento dos partidos de centro e de direita que integrarem o governo (PMDB, PR, PTB e PP), assim como pelos políticos de esquerda com viés mais libertário.
Ou seja, no ano que vem, a esquerda brasileira se sairá fortalecida. Mas não considero isso como um golpe mortal contra a oposição de centro-direita. Desde o início do atual ciclo de crescimento econômico no Brasil, noto que há uma crescente corrente ideológica de classe média que defende valores como o empreendedorismo, as liberdades individuais, a redução dos impostos e a redução do controle estatal sobre as decisões dos indivíduos. E essa linha de pensamento cresce sensivelmente com cada escândalo de corrupção que estoura no governo federal. Por isso, com o crescimento da classe média no período recente, acredito em um fortalecimento do liberalismo político, a ponto de achar que qualquer desaceleração ou recessão macroeconômica provoque uma virada política na eleição de 2014. O provável crescimento dos liberais pode ser limitado, e talvez até inibido, por dois fatores. Primeiro, novamente a baixa qualidade da educação no Brasil, que pode restringir o surgimento de consciência política na nova classe média que surgiu nessa década. Segundo, o descompromisso político da classe média brasileira. De acordo com conversas que tenho com liberais, e até mesmo lendo blogs de liberais, percebo que eles, em geral, têm aversão à política real do país, muitas vezes preferindo anular ou justificar o voto a assumir compromisso com algum candidato ou partido. Eles parecem preferir ser uma "bolha de pureza ideológica" a encarar as dificuldades do mundo real e correr o risco de descobrirem estar errados em alguns pontos, algo como um PSOL de direita. Quem ganha com isso, é claro, é a esquerda.
Essa classe média liberal brasileira, quando têm preferências políticas, tendem a ser simpatizantes do PSDB. Por isso, acredito que esse partido pode se fortalecer para a eleição de 2014 se adotar uma plataforma de eleição alinhada com um centro-liberalismo. Além disso, o partido pode se fortalecer com a incorporação de outras siglas menores mais simpáticas a essa ideologia, como o PPS, o PSL e talvez até o PV. Já o DEM, que tentou atrair a classe média na oposição ao governo Lula, acabou escorraçado pela opinião pública devido exatamente aos escândalos de corrupção a que o partido passou, sobretudo no Distrito Federal, o que deve reduzir permanentemente o seu poder no cenário político nacional. Talvez, uma forma desse partido se fortalecer é assumir posições mais conservadoras, procurar fusões com partidos cristãos como o PTC, o PSC ou o PSDC, e mudar o nome para Partido Democrata Cristão (PDC). Vejo um amplo mercado para essas idéias na política brasileira contemporânea, sobretudo nas classes mais baixas da sociedade e no interior do país. Mas não sei se o eleitorado agüenta um partido com tantas refundações e renomeações.
Fiz toda essa análise assumindo a hipótese de que Dilma governará em todo o seu mandato. Mas, e se ela não sobreviver a um escândalo de corrupção ou a uma crise provocada por déficit na balança de pagamentos? Será que a esquerda apoiaria um governo liderado pelo Michel Temer? Isso provocaria um terremoto na articulação política nacional.